viril

/VIRIL OU POR UMA PERFORMANCE QUEER DA MASCULINIDADE*

POR ANA LUISA SANTOS

BOA NOITE A TODES, A TODAS E A TODOS

SEJAM BEM VINDAS, SEJAM BEM VINDAS AS PRESENÇAS

ACHO MUITO INTERESSANTE ESTAR AQUI AGORA

ACHO MUITO INTERESSANTE ESTAR AQUI AGORA PORQUE EU ESTIVE NO PRIMEIRO BACURINHAS EM DEBATE EM 2014 QUE TINHA COMO TEMA “MULHERIDADES”

E AGORA, QUATRO ÂNUS DEPOIS, ESTOU AQUI AGORA NO BACURINHAS EM DEBATE COM O TEMA “MASCULINIDADES”.

ACHO MUITO INTERESSANTE PORQUE EU ME SINTO NO LUGAR CERTO, OU MELHOR, INCERTO AO HABITAR ESSES DOIS ESPAÇOS DAS MULHERIDADES E DAS MASCULINIDADES. E AGRADEÇO ÀS BACURINHAS POR ME RECEBER NESSE ENTRE.

EU PESQUISO MASCULINIDADES EM UM CONTEXTO MAIS AMPLO DE INVESTIGAÇÃO SOBRE A SEXUALIDADE, A SEXUALIDADE COMO ESSE ESPAÇO E EXPERIÊNCIA DE CONFLITO DO CORPO, DO DESEJO E DA SOCIEDADE.

ESSA PEQUISA ESTÁ SE DESDOBRANDO EM UMA SÉRIE DE TRABALHOS CHAMADA “VIRIL”, QUE É COMPOSTA POR TRÊS DRAMATURGIAS PARA PERFORMANCE, QUE SÃO: “ESPÉCIE” (SOLO DE IGOR LEAL), “QUEDA LIVRE” (DRAMATURGIA INÉDITA EM PARCERIA COM DANIEL TOLEDO) E AGORA ESSA VERSÃO DE “VIRIL” QUE ESTÁ DIANTE DE VOCÊS E DE MIM.

ESSA PESQUISA SOBRE AS MASCULINIDADES E SEUS DESDOBRAMENTOS EM TRABALHOS ARTÍSTICOS ESTÃO RELACIONADOS COM A REFLEXÃO SOBRE AS LINGUAGENS DA VIOLÊNCIA, QUE FOI O TEMA DO MESTRADO QUE CURSEI NA PÓS-GRADUAÇÃO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA UFMG HÁ 18 ANOS.

RECENTEMENTE INTENSIFIQUEI OS ESTUDOS SOBRE AS MASCULINIDADES DE UM OUTRO PONTO DE VISTA, QUE A SÉRIE VIRIL DE TRABALHOS BUSCA EXPERIMENTAR COMO UM LABORATÓRIO DE CRIAÇÃO E DE LUTA POLÍTICA.

ESTOU MUITO INTERESSADA NOS ASPECTOS DE VULNERABILIDADE QUE COMPÕEM AS MASCULINIDADES COMO CAMPOS SIMBÓLICOS DENTRO DA ECONOMIA SEXUAL DO PATRIARCADO: OS TRABALHOS ARTÍSTICOS ACONTECEM A PARTIR DE POÉTICAS DE DESCONTRUÇÃO DAS MASCULINIDADES COMO ESTRATÉGIAS DE DESARTICULAÇÃO DO CAPITALISMO PATRIARCAL OCIDÊNTICO.

QUANDO EU FALO VULNERABILIDADE QUER DIZER QUE ASPECTOS CLÁSSICOS DAS MASCULINIDADES, COMO A VIRILIDADE, OU A FORÇA OU O AUTORITARISMO OU A INCOMUNICABILIDADE NÃO CONSTITUEM O FOCO PRINCIPAL DE ATENÇÃO PERFORMATIVA, EMBORA, OBVIAMENTE, ESSES ASPECTOS ESPECTROS QUE PERMEIAM O PANORAMA CULTURAL MISÓGINO QUE CARACTERIZA O ESPAÇO POLÍTICO DA VIDA, ESPECIALMENTE NO BRASIL, E QUE POR ISSO NÃO PODEM DEIXAR DE SER CONSIDERADOS COMO TEMAS POLÍTICOS.

MAS AS VULNERABILIDADES DAS MASCULINIDADES PARECEM COMPARECER COMO UM LUGAR VIBRANTE, UM ESPAÇO DE DIÁLOGO, UMA CONTRA-IMAGEM, UM ANTI-CRIME. ENFIM, AS VULNERABILIDADES COMO MATERIAIS POTENTES PARA A ARTE DA PERFORMANCE.

PARA FALAR DAS VULNERABILIDADES DAS MASCULINIDADES OU PARA TOCAR NESSE ASSUNTO, DECIDI, PARA ESSA AÇÃO, COMPARTILHAR ALGUMAS FRAGILIDADES DA EXPERIÊNCIA DE MASCULINIDADES QUE ATRAVESSAM O CORPO, O DESEJO E A SEXUALIDADE QUE EXPERIMENTO AGORA.

PERCEBO QUE DIALOGO COM UMA COMPREENSÃO NÃO-BINÁRIA DO EXERCÍCIO DA EXISTÊNCIA QUE EXPERIMENTO.

COMO UMA PESSOA QUE SE ARTICULA DE MANEIRAS NÃO-BINÁRIAS, NÃO SOU MULHER, NÃO SOU HOMEM, NÃO SOU TRANSSEXUAL, NÃO ESTOU EM TRANSIÇÃO, EU SOU A TRANSIÇÃO, MONSTRO, MONSTRA, TRAVESSIA.

A SEXUALIDADE QUE NÃO É SÓ MINHA, QUE NÃO É NEUTRA, QUE NÃO É SÓ UMA, QUE SÃO VÁRIAS QUE HABITAM A PERCEPÇÃO, DESEJOS, GESTOS, ORIFÍCIOS, PELES, MUCOSAS, HORMÔNIOS, PÊLOS, ODORES, HUMORES, AROMAS.

AS SEXUALIDADES QUE PASSAM TAMBÉM PELA LEITURA DO QUE É CONSIDERADO COMO CONSTITUINTE DAS MASCULINIDADES COMO ESPAÇOS DE PESQUISA.

GOSTARIA DE PROPOR UM DEBATE SOBRE AS MASCULINIDADES A PARTIR DE ALGUMAS PROVOCAÇÕES. VOU COMEÇAR PELA A RELAÇÃO COM ENTRE MASCULNIDADES E TEMPORALIDADES NA EXPERIÊNCIA DO CONTEMPORÂNEO. TAMBÉM PRETENDO TOCAR A FRICÇÃO ENTRE AS MASCULINIDADES E AS CORPOREIDADES, NO SENTIDO DA EXPERIÊNCIA BURACO, A PARTIR DE UMA REFLEXÃO COM OS GESTOS DE VER E OUVIR E A RELAÇÃO ENTRE POSSIVEIS EXERCÍCIOS DOS ORIFÍCIOS DOS OLHOS, DOS OUVIDOS E DOS ÂNUS. DAÍ TAMBÉM PROPONHO UMA REFLEXÃO SOBRE OS VESTÍGIOS E AS MASCULINIDADES OU AS MASCULINIDADES COMO VESTÍGIOS: CARACTERÍSTICAS VIRIS FALIDAS NAS POSSIBILIDADES FEMINISTAS DE ARTICULAÇÃO POLÍTICA ATUAL.

NA RELAÇÃO COM A EXPERIÊNCIA DO TEMPO NA CONTEMPORANEIDADE, COMPARTILHO A REFERÊNCIA DO REGIME DE PRIVAÇÃO SENSORIAL DO 24/7. 24/7 É UMA IDEOLOGIA DAS 24 HORAS POR 7 DIAS POR SEMANA, ESSA DIMENSÃO DE APROPRIAÇÃO DO TEMPO DA VIDA PELO TEMPO DAS MÁQUINAS OU DA PRODUÇÃO CAPITALISTA.

NESSE REGIME IDEOLÓGICO DE TEMPO, HÁ UMA SITUAÇÃO DA VISIBILIDADE INSTRUMENTALIZADA E CONSTANTE, EM QUE É FABRICADO UM MUNDO QUE EXCLUI RADICALMENTE A POSSIBILIDADE DE CUIDADO, ATENÇÃO OU CONSOLO. TRADUZINDO: A TENTATIVA DE INSCRIÇÃO GENERALIZADA DA VIDA HUMANA NA DURAÇÃO SEM DESCANSO, DEFINIDA POR UM PRINCÍPIO DE FUNCIONAMENTO CONTÍNUO.
ACREDITO QUE ESSA IDÉIA DE FUNCIONAMENTO CONTÍNUO REMETE A UMA DAS REFERÊNCIAS DA MASCULINIDADE NO SENTIDO DE UMA VIRILIDADE PERPÉTUA, UM VIAGRA WAY OF LIFE
UM MODO DE EXCITAÇÃO PROGRAMADA E INFINITA
QUE IMPLICA A RENÚNCIA À PRETENSÃO DE QUE O TEMPO POSSA ESTAR ACOPLADO A QUAISQUER TAREFAS DE LONGO PRAZO, INCLUSIVE FANTASIAS DE DESENVOLVIMENTO.

A ALTERIDADE É O MOTOR DE TODA MUDANÇA HISTÓRICA.
MAS O TEMPO 24/7 É UM TEMPO DE INDIFERENÇA, NO QUAL A FRAGILIDADE HUMANA É CADA VEZ MAIS INADEQUADA.

ESSE REGIME CAPITAL DE TEMPO INSTITUI A DISPONIBILIDADE ABSOLUTA E PORTANTO UM ESTADO DE NECESSIDADES ININTERRUPTAS, SEMPRE ENCORAJADAS E NUNCA APLACADAS.
AGORA OS CORPOS ASSIMILAM UMA SUPERABUNDÂNCIA DE SERVIÇOS, IMAGENS, PROCEDIMENTOS E PRODUTOS QUÍMICOS EM NÍVEL TÓXICO E FATAL.

ESSE ROUBO DE TEMPO QUE O CAPITALISMO NOS SUBMETE PROMOVE A DESARTICULAÇÃO DE QUAISQUER DESDOBRAMENTOS DE EXPERIÊNCIAS E EXPERIMENTAÇÃO
A FORÇA HOMOGENEIZADORA DO CAPITALISMO É INCOMPATÍVEL COM QUAL ESTRUTURA INERENTE DE DIFERENCIAÇÃO

INTUO QUE ESSE ESTADO DE PRONTIDÃO POSSUI INTERCESSÕES COM AS IDEIAS DE VIRILIDADE DE UMA SUPOSTA MASCULINIDADE (SER HOMEM PODE SER NÃO PODER DIZER NÃO PARA UMA MULHER QUE TE QUER)
NO SLEEP MODE, NADA ESTÁ DE FATO DESLIGADO OU EM ESTADO REAL DE REPOUSO.

O QUE SIGNIFICA VIVER A VIDA AO MÁXIMO?

O CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO ARTICULA UM CONJUNTO DE FORÇAS QUE VALORIZAM O SUJEITO CONSTANTEMENTE ENVOLVIDO, OPERANDO, INTERAGINDO, COMUNICANDO, REAGINDO OU PROCESSANDO EM ALGUM MEIO TELEMÁTICO.
CONEXÃO PERMANENTE
ALUCINAÇÃO DA PRESENÇA
INSTRUMENTALIZAÇÃO DA LINGUAGEM ATRAVÉS DA INTIMAÇÃO, DA PALAVRA DE ORDEM, DA VOZ DE COMANDO COM O OBJETIVO DE GERAR MEDO
UMA DEPRECIAÇÃO DA FRAQUEZA E DA INADEQUAÇÃO DO TEMPO HUMANO COM SUAS TESSITURAS CONFUSAS E IRREGULARES, QUE SOLAPA A RELEVÂNCIA OU O VALOR DE QUALQUER INTERVALO OU VARIAÇÃO

A ANTIGA IDÉIA DE EXPERIÊNCIA COMPARTILHADA ESTÁ SE ATROFIANDO A PARTIR DO IMPACTO DE DISPOSITIVOS NAS FORMAS DE SOCIABILIDADE COMO REFEIÇÕES, CONVERSAS E SALAS DE AULA

O 24/7 NOS INCITA A UMA IDENTIFICAÇÃO INSUSTENTÁVEL E AUTODESTRUTIVA COM SUAS EXIGÊNCIAS FANTASMAGÓRICAS
O 24/7 INCITA A ADQUIRIR, TER, GANHAR, DESEJAR ARDENTEMENTE, DESPERDIÇAR E DESPREZAR

GOSTARIA DE FAZER UMA TRANSIÇÃO PARA AS CORPOREIDADES OU DISPOSITIVOS DE PODER EXERCIDOS SOBRE OS CORPOS.
OS GESTOS DE OLHAR E DE OUVIR, ACREDITO, TAMBÉM SÃO VIAS INTERESSANTES PARA SE PENSAR AS MASCULINIDADES.

NO REGIME 24/7 HÁ UMA DESINTEGRAÇÃO DA CAPACIDADE HUMANA DE VER E DE OUVIR, EM ESPECIAL DA HABILIDADE DE ASSOCIAR O TEXTO OU A IMAGEM COM AVALIAÇÕES ÉTICAS E SOCIAIS.
POR MEIO DE UMA OFERTA INFINITA E PERPETUAMENTE DISPONÍVEL DE SOLICITAÇÕES E ATRAÇÕES, O 24/7 INCAPACITA A VISÃO E A ESCUTA POR MEIO DE PROCESSOS DE HOMOGENEIZAÇÃO, REDUNDÂNCIA E ACELERAÇÃO.
O QUE ESTÁ ACONTECENDO É UMA DIMINUIÇÃO DAS CAPACIDADES PERCEPTIVAS.
O CASO É DE UMA ESTRIDÊNCIA ININTERRUPTA DO ESTÍMULO MONÓTONO, NO QUAL É NEUTRALIZADA UMA EXTENSA GAMA DE CAPACIDADES REATIVAS.
AS IMAGENS SE TORNARAM UM DOS MUITOS ELEMENTOS DESCARTÁVEIS QUE, POR SEREM ARQUIVÁVEIS, JAMAIS SÃO JOGADAS FORA CONTRIBUINDO PARA UM PRESENTE CADA VEZ MAIS CONGELADO E DESPROVIDO DE FUTURO.

CORTE
PARTE DO MEU PROCESSO DE TRABALHO COMO PERFORMER É NÃO FAZER NADA, ENCARAR O SILÊNCIO, OBSERVAR O TEMPO E SUAS DURAÇÕES. ME PREPARAR PARA A ESCUTA, EXERCITAR A MEMÓRIA E A MEDITAÇÃO, PERCEBER AS POSSIBILIDADES DE EXPERIÊNCIA E DE CONVICÇÃO.
A PERFORMANCE COMO LABORATÓRIO VIRIL VULNERÁVEL
A VIDA VULNERÁVEL EM SUA VIRILIDADE
VIDA VIRILHA

NO PROCESSO DE PREPARAÇÃO DESSA AÇÃO VIRIL INCLUI UMA REFLEXÃO BIOGRÁFICA QUE PARTIU DE ALGUMAS PERGUNTAS:
COMO VOCÊ ACESSA A SUA MASCULINIDADE?
QUANDO VOCÊ ACESSA A SUA MASCULINIDADE?
POR QUE?
QUANTO?
PARA QUE?
POR QUEM?

COMPARTILHO UMA EXPERIÊNCIA SUBJETIVA COMO UM EXPERIMENTO ARTÍSTICO DE ARTICULAÇÃO DE UM MATERIAL PESSOAL SINGULAR

RECENTEMENTE TERMINEI UM RELACIONAMENTO AFETIVO SEXUAL LÉSBICO DE QUATRO ANOS E MUITAS INTENSIDADES
OS MOTIVOS DA SEPARAÇÃO SÃO ÉTICO-POLÍTICOS: DISSINCRONIA DE BUSCAS E RITMOS DE VIDA, DE TRABALHO, DE DESEJOS
MESMO COM O RECONHECIMENTO E A ELABORAÇÃO DESSAS MOTIVAÇÕES DO FIM NO SENTIDO DA IMPOSSIBILIDADE DE NOVAS EXPANSÕES DA RELAÇÃO, UM OUTRO TIPO DE DESAFIO ATRAVESSOU O MEU PROCESSO DE VIDA.

EU FIQUEI MUITO ABALADA COM ESSA TRANSFORMAÇÃO DA POSSIBILIDADE DE CONVIVÊNCIA PORQUE, A PRINCÍPIO, NÃO TOMEI A INICIATIVA DO ROMPIMENTO
O CONTEXTO DE EXÍLIO EM QUE ME ENCONTRO, DESDE QUE MUDEI DE BELO HORIZONTE PARA SÃO PAULO, ME FEZ E ME FAZ VALORIZAR AINDA MAIS OS VÍNCULOS E EU AINDA ACREDITAVA, ATÉ CERTO MOMENTO, NA POSSIBILIDADE DE SUPERAÇÃO DOS CONFLITOS.
ISSO PARA DIZER QUE EU DEMOREI MAIS, LEVEI MAIS TEMPO PARA ME DESVINCULAR, INCLUSIVE SEXUALMENTE, DA MINHA COMPANHEIRA.
E ISSO GEROU UMA SITUAÇÃO EM QUE EU PERMANECI SOZINHA ENQUANTO ELA SE ENVOLVEU COM OUTRA PESSOA.

ESSA SITUAÇÃO FOI MUITO DIFÍCIL PARA MIM PORQUE ME REMETEU A DIMENSÕES DE REJEIÇÃO. A IDÉIA DE QUE FUI TROCADA É UMA ARMADILHA CAPITALISTA DO AFETO EM UMA DE SUAS VERSÕES MAIS VIRIS.
COMBATI ARDUAMENTE ESSA IMPRESSÃO IMEDIATA E CONSEGUI PERMANECER ALTIVA.

NO ENTANTO, NO PROCESSO DE TENTATIVA DE SUPERAÇÃO DO ROMPIMENTO E DA SENSAÇÃO DE REJEIÇÃO, POR UM MOMENTO, ACREDITEI QUE EU PRECISAVA FICAR COM ALGUÉM TAMBÉM. E QUE FICAR COM ALGUÉM IA RESOLVER TUDO.
UMA NARRATIVA DE QUE EU PRECISAVA PROVAR QUE EU PODERIA FICAR COM ALGUÉM. MAS SIMPLESMENTE NINGUÉM ESTAVA ME COBRANDO ISSO.ERA UMA AUTO COBRANÇA, UM TIPO DE PRESSÃO QUE EU SENTIA POR UMA INTERPRETAÇÃO EQUIVOCADA DA SEXUALIDADE, DO AFETO COMO UM MERCADO, UMA MOEDA DE TROCA, EM QUE EU NÃO PODERIA FICAR DEFICITÁRIA. NINGUÉM ESTAVA ME COBRANDO ISSO, MAS PARECIA QUE EU TINHA UMA DÍVIDA PARA COM PARTE DA MINHA SEXUALIDADE, TALVEZ PARA COM A PARTE DA EXPERIÊNCIA DE SEXUALIDADE QUE EXPERIMENTO E QUE POSSUI ADERÊNCIA COM A MASCULINIDADE OU COM A PARTE DA SEXUALIDADE QUE MUITAS VEZES ESTÁ LIGADA À MASCULINIDADE NO SENTIDO DO CONTROLE, NO SENTIDO DO PODER, NO SENTIDO DO PREENCHIMENTO, NO SENTIDO DA NÃO DEMONSTRAÇÃO DA VULNERABILIDADE COMO ANTI-VIRILIDADE.

DAÍ EU TENTEI SAIR, SAIR A NOITE PARA PAQUERAR, MAS PRIMEIRO, EU NÃO SOU UMA PESSOA DE SAIR MUITO A NOITE PARA A BALADA. E DEPOIS OU ANTES, EU NUNCA ME SENTI BEM NESSE ESPAÇO PEGAÇÃO QUE CARACTERIZA A BALADA. DESDE MUITO JOVEM COMO BISSEXUAL E COMO LÉSBICA ME INCOMODOU MUITO ESSE AMBIENTE AÇOUGUE QUE POR VEZES CARACTERIZA OS ESPAÇOS DE ENCONTRO DA NOITE, EM QUE PESSOAS E EU INCLUÍDA SÃO CONVERTIDAS EM PEDAÇOS DE CARNE COMESTÍVEIS OU NÃO.

ENTÃO EU ME CONFORMEI QUE EU NÃO IA CONSEGUIR ISSO, DE FICAR COM OUTRA PESSOA, DESSA MANEIRA IMEDIATA E QUE, NA VERDADE, NEM ERA ISSO QUE EU PRECISAVA NAQUELE MOMENTO.

E ISSO FOI UMA EXPERIÊNCIA DE DESCONSTRUÇÃO DA VIRILIDADE PARA MIM.

OUTRO FATO MUITO INTERESSANTE FOI QUE QUANDO FINALMENTE EU FIQUEI COM ALGUÉM, QUER DIZER, TIVE UMA EXPERIÊNCIA AFETIVO-SEXUAL COM OUTRA PESSOA.
COMO EU DISSE, EU ACHAVA QUE FICAR COM ALGUÉM IA RESOLVER UMA SÉRIE DE COISAS NO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO SENTIMENTO DE REJEIÇÃO, QUE IA PROVAR A CAPACIDADE SEXUAL QUE PODE SER PERCEBIDA EM MIM E QUE FORA ABALADA PELO FIM DO RELACIONAMENTO E DO ENVOLVIMENTO SEQUENCIAL DE MINHA EX-COMPANHEIRA COM OUTRA PESSOA.

MAS O CURIOSO É QUE FICAR COM OUTRA PESSOA NÃO RESOLVEU NADA.
NA VERDADE, FICAR COM OUTRA PESSOA NUNCA RESOLVE NADA, EU SEI, MAS ESPECIALMENTE NESSE CASO, EM QUE EU TINHA UMA EXPECTATIVA EQUIVOCADA DE SOLUÇÃO PARA UMA SÉRIE DE SENTIMENTOS CONFUSOS DE FRAGILIDADE, FICAR COM OUTRA PESSOA, TRANSAR COM ELA, NÃO ADIANTOU MUITA COISA.

QUER DIZER, FOI MUITO BOM QUE ACONTECEU, FOI MUITO LEGAL CONHECER ESSA PESSOA, MAS ESSE AFETO NÃO APLACOU A SENSAÇÃO DE VULNERABILIDADE EM QUE ME ENCONTRAVA, EM QUE ME ENCONTRO.
E ISSO ESTÁ SENDO MUITO REVELADOR PARA MIM PORQUE EU TIVE A OPORTUNIDADE DE PERCEBER QUE FICAR COM OUTRA PESSOA, TRANSAR COM ELA, NÃO NECESSARIAMENTE ME FORTALECEU, DE UM PONTO DE VISTA DA SEXUALIDADE.
NA VERDADE, ESSA OUTRA POSSIBILIDADE DE ENCONTRO PARA MIM FOI BASTANTE ESCLARECEDOR NO SENTIDO DE UMA EXPERIÊNCIA DE LUTO: FICAR COM OUTRA PESSOA, CONSEGUIR TRANSAR COM ELA, SIGNIFICAVA QUE EU ESTAVA DANDO CONTINUIDADE NO PROCESSO DE SEPARAÇÃO E QUE O FATO DE EU CONSEGUIR FICAR COM OUTRA PESSOA, TRANSAR COM ELA, SIGNIFICA QUE EU ESTAVA ROMPENDO O ANTIGO RELACIONAMENTO EM OUTROS LUGARES. E ESSA CONSTATAÇÃO ME LEVOU A UM ESTADO DE LUTO MUITO INTENSO, UM LUTO DO VÍNCULO COM AQUELA PESSOA COM QUE ME RELACIONEI INTIMAMENTE E DE MANEIRA CÚMPLICE POR TANTO TEMPO, UM OUTRO LUTO DA MASCULINIDADE EM MIM.
UMA EXPERIÊNCIA DA MASCULNIDADE COMO INDIGÊNCIA.

APRESENTO AQUI, PORTANTO, OS VESTÍGIOS DE MASCULINIDADE QUE ME HABITAM OU JÁ HABITARAM EM MIM. MAS TAMBÉM OS VESTÍGIOS COM QUE CONVIVI DURANTE TODA A MINHA EXPERIÊNCIA DE VIDA NA FAMÍLIA, NA CIDADE, NO TRABALHO, NAS ARTES E EM OUTRAS FORMAS DE RELAÇÕES SOCIAIS.

COMO CONVIVEMOS COM AS MASCULINIDADES?
EM QUAIS ASPECTOS ELAS SE MANIFESTAM EM NOSSAS VIDAS?
COM QUAIS IMAGENS DAS MASCULINIDADES PRECISAMOS LIDAR?

CITO ALGUNS VESTÍGIOS, ALGUMAS PISTAS, ALGUNS RASTROS QUE AINDA CONFIGURAM CONFUSÕES E, MUITAS VEZES, VIOLÊNCIAS:
POR QUE OS HOMENS SÃO PERIGOSOS?
SUAS ATITUDES AGRESSIVAS SÃO SINAIS DO QUÊ?
O QUE DEFINE O MACHO?
O QUE TORNA UM HOMEM DE FATO UM HOMEM?

SE AS FORMAS DE PODER DETERMINAM AS DIFERENÇAS DE GÊNERO, O MASCULINO PODE SER ENTENDIDO NÃO APENAS COMO UMA DETERMINAÇÃO SEXUAL DA CULTURA, MAS, A PARTIR DESSA DETERMINAÇÃO DE GÊNERO, COMO UMA FORMA QUE OS HOMENS E AS MASCULNIDADES ENCONTRARAM DE EXERCER SOCIALMENTE SEU PODER HEGEMÔNICO.
NESSE SENTIDO, A CRISE ATUAL DO MASCULINO SERIA A CRISE DE PODER DO MACHO E DE ALGUMAS EXPRESSÕES DAS MASCULNIDADES
PERDIDOS NA BUSCA DE UMA NOVA DEFINIÇÃO DE NOSSAS VIRILIDADES, EXPOMOS UMA ANSIEDADE E UM DESAMPARO.
SENTIMO-NOS PERDIDOS ANTE A CRESCENTE RECUSA DOS VALORES MASCULINOS ETERNOS, AOS QUAIS ESTÁVAMOS ACOSTUMADOS, E INSEGUROS DIANTE DA POSSIBILIDADE E NECESSIDADE DE INVENÇÃO DE UMA NOVA MASCULINIDADE.
SENTIMO-NOS CONFUSOS E BUSCAMOS NOS ESTRUTURAR A PARTIR DE ELEMENTOS EXTERIORES QUE POSSAM COMPENSAR NOSSAS FRÁGEIS ESTRUTURAS INTERNAS.
PERCEBEMOS TENTATIVAS DE SAÍDAS DESSA QUESTÃO COMO O TRABALHO OBSESSIVO QUE GARANTE ADMIRAÇÃO, A SEDUÇÃO SEM LIMITES QUE NÃO ADMITE COMPROMISSOS AFETIVOS E ATÉ MESMO O BODY BUILDING, UMA CONSTRUÇÃO CORPORAL EXTERNA PARA COMPENSAR UMA FALHA INTERNA.
AS MASCULINIDADES ESTÃO CONFRONTADAS COM SEU PRÓPRIO ENIGMA, QUE IMPLICA UM IMPASSE DE ESTRANHAMENTO POIS O MACHO RARAMENTE PRECISOU FAZER PERGUNTAS SOBRE SI MESMO. AFINAL, A HISTÓRIA SEMPRE FOI ESCRITA À SUA IMAGEM E DO SEU PONTO DE VISTA.
A IDEIA DE MASCULINIDADE FUNCIONA COMO UMA ARMADILHA
A MASCULINIDADE COMO UMA ARMADILHA DE SER
PARA SER HOMEM É PRECISO TORNAR-SE HOMEM
O CAMINHO PARA A MASCULINIDADE PRECISA SER CONQUISTADO AO MESMO TEMPO QUE PERMANECE SEMPRE POSSÍVEL O RISCO DE PERDÊ-LA
PARA O MACHO QUALQUER PERDA IMPLICA A PERDA DO FALO, SEJA COM DINHEIRO, AMOR, PROFISSÃO OU INFLUÊNCIA SOCIAL. TUDO ISSO REPERCUTE NO HOMEM COMO PERDA DE AUTORIDADE E UMA PROVÁVEL PERDA DE IDENTIDADE MASCULINA.
NAS SOCIEDADES PATRIARCAIS É PROVAVELMENTE ESSA INSEGURANÇA BÁSICA QUE LEVA OS HOMENS A MARCAR COM TANTA INSISTÊNCIA O SEU ESPAÇO ATRAVÉS DA COMPETIÇÃO, DA VIOLÊNCIA, DA GUERRA E A ESPALHAR SEUS SÍMBOLOS POR ONDE PASSAM: OBELISCOS FÁLICOS, ARMAS CONTUNDENTES, PROGRESSO VERTICALIZADO.
A INFLAÇÃO FÁLICA É UM PROCESSO ESSENCIAL ENQUANTO IMPULSO CRIADOR
O FALO OU SEJA O PÊNIS INFLADO NÃO É PATOLÓGICO EM SI MESMO
MAS QUANDO O ASPECTO FÁLICO PRESENTE NA MASCULINIDADE ENCONTRA-SE CINDIDO A INFLAÇÃO DESVIA-SE DO SEU CURSO CRIATIVO TORNANDO-SE PERIGOSA.
NO UNIVERSO PATRIARCAL-FALOCRÁTICO, O PRESSUPOSTO É DE QUANTO MAIS O MEMBRO VIRIL MAIOR A MASCULINIDADE DO HOMEM.
AÍ SE INSEREM A BUSCA INSACIÁVEL DE PODER, O MACHISMO E A VIOLÊNCIA.
EM OUTRAS PALAVRAS, TRATA-SE DE UM DESLOCAMENTO EMOCIONAL VISANDO DEFENDER, ATRAVÉS DO ATAQUE, A PRÓPRIA IDENTIDADE MASCULINA PRESTES A SE ROMPER
O FEMININO TORNA-SE O ALVO PREDILETO PORQUE OPOSTO
HOMEM NÃO É MULHER
A AFIRMAÇÃO DE VIRILIDADE APÓIA-SE EM ESCORAS COMO NÃO SER PASSIVO
TANTO QUANTO A AMEAÇA DO FEMININO, A AMEAÇA QUE A HOMOSSEXUALIDADE MASCULINA REPRESENTA PARA AS RELAÇÕES DE PODER NO CONTEXTO PATRIARCAL DENUNCIA COMO A VOCAÇÃO DO MACHO ESTÁ ACONRADA EM MÚLTIPLAS CONSTRUÇÕES.
O MACHO QUER SE DIFERENCIAR DA FÊMEA SENDO O ELEMENTO ATIVO E, PORTANTO, DOMINADOR.
ELE É MACHO (E NÃO FÊMEA) PORQUE NÃO DÁ.
DAÍ A GRAVIDADE IMPLICADA EM DAR O CU
ASSIM COMO O FEMININO, O ANAL É O REVERSO DA MEDALHA DO FÁLICO.
NO CONTEXTO PATRIARCAL ELE SIGNIFICA O PASSIVO EM CONTRAPOSIÇÃO AO ATIVO.

ACREDITO QUE DEVE SER MUITO DIFÍCIL ( OU NÃO) PARA OS HOMENS HETEROCENTRADOS SAIR DA CATEGORIA UNIVERSAL QUE A PALAVRA HOMEM HABITA
ABRIR MÃO DA LINGUAGEM
TER QUE INVENTAR OUTRA LINGUAGEM
OUTROS DIÁLOGOS
ABRIR MÃO DO CONTROLE
SAIR DO ARMÁRIO COM AS INTIMIDADES E AS QUESTÕES DAS MASCULINIDADES SER CAPAZ DE IMAGINAR MASCULINIDADES IMPROVÁVEIS
EU SAÚDO ESSA POSSIBILIDADE
QUAL CONTRADIÇÃO VOCÊ QUER HABITAR?
BEM VINDOS À VIDA COMO TRAVESSIA

*MANIFESTO PERFORMADO DURANTE O BACURINHAS EM DEBATE, JUNHO DE 2018, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.








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